Rubem Valentim - Obras

       
 Objeto emblemático nº 6 (1975)  Objeto emblemático (1969)
 Sem título (1989)


A obra de Rubem Valentim compreende pinturas e esculturas. Até meados da década de 1960, quando o artista instalou-se em Brasília, trabalhou fundamentalmente com a bidimensionalidade, produzindo telas compostas com tinta a óleo, têmpera-ovo (entre 1963 e 1967) e tinta acrílica. No início de sua carreira artística, até o ano de 1951, produziu obra figurativa com naturezas-mortas, paisagens urbanas, flores e figuras humanas, com influências do realismo e do expressionismo. Essa produção figurativa convivia com obras astratas e com composições em que convivem signos abstratos e figurativos. A partir de 1953-1954, começou a incorporar símbolos e emblemas do candomblé em suas telas abstratas, o que se tornou mais frequente e claro a partir de 1955. 

A partir de sua chegada ao Rio de Janeiro, em 1957, abandonou completamente a figuração e aprofundou sua pesquisa formal, reduzindo o número de formas e elementos em cada composição. Sua pintura ganhou um caráter mais rigoroso e fortemente geométrico, próximo de uma estética concretista. Ao contrário desta, contudo, não se tratava de pura forma geométrica, sem referência externa, mas sim de composições a partir de signos próprios da iconografia das religiões afro-brasileiras - especialmente as ferramentas do candomblé, religião da qual o artista era praticante, mas também os pontos riscados da umbanda, que ele só veio a conhecer na década de 1960 no Rio de Janeiro. A partir de 1959, começou a depurar com maior rigor cada elemento formal, chegando às soluções plásticas que caracterizariam sua obra de maturidade. Alguns críticos lhe atribuíram também influências da cultura indígenas e mesmo um parentesco com outras tradições místicas e religiosas, mas o diálogo com a religiosidade afro-brasileira é mais direto e evidente. Por isso, Clarival do Prado Valladares classificou sua obra como "arte semiótica", isto é, uma arte composta a partir de signos presentes na cultura - no caso, na simbologia religiosa. José Merquior a denominou "supra-semiótica", no sentido de que manipula e transforma conscientemente esses signos. Cabe observar que o próprio artista rejeitou sua filiação às correntes artísticas europeias, entre as quais a arte concreta, reafirmando o caráter nacional de sua produção, muito embora tenha participado da I Bienal Internacional de Arte Construtiva de 1969 em Nuremberg (Alemanha).

De qualquer modo, Valentim empreendeu um diálogo entre a geometria da simbologia religiosa e a geometria formal de uma importante parcela da arte moderna, aproximando o que então podia ser considerado como "arcaico" daquilo que era visto como "moderno". Com isso, inseriu uma dimensão religiosa que atravessava a geometria formal, de certa forma humanizando e carregando de força simbólica sua racionalidade geométrica. Ao mesmo tempo, evidenciou convergências e aproximações entre as concepções de espaço da geometria euclidiana e de imaginários religiosos.

O artista empregava cores sólidas e contrastantes para ressaltar a geometria das formas, e frequentemente compunha suas obras com um forte senso de simetria, organizada bilateralmente a partir de um eixo vertical (característica que também existe em muitos dos signos empregados nas religiões afro-brasileiras). Em alguns casos, essa simetria era insinuada, mas não plenamente realizada; em outros, ela era simultaneamente complementada e perturbada por uma sugestão parcial de simetria alto-baixo.

A partir de 1967, já em Brasília, o artista passou a estender seu trabalho com a forma para a terceira dimensão, de onde resultaram seus relevos e, finalmente, seus objetos e esculturas em madeira policromada. Mantendo a mesma estética geométrica, a mesma referência à simbologia religiosa e o mesmo emprego de cores contrastantes, ele criou esculturas que, pelo seu caráter religioso, aproximavam-se de templos ou altares, como inclusive o atesta a instalação apresentada em 1977 à XIV Bienal de São Paulo, batizada de Templo de Oxalá (que contava com painéis e esculturas em madeira branca). O artista manteve a construção simétrica de suas obras e, em muitos casos, estendeu essa simetria para a terceira dimensão (como fica claro na obra de 1969 Objeto emblemático, acima). Na medida em que também são tridimensionais os próprios emblemas do candomblé que lhe serviram de material de elaboração estética, essa passagem à escultura não se configurou como ruptura, mas como aprofundamento.

Ele não interrompeu, porém, a produção de telas. Alguns críticos ressaltaram um desenvolvimento em sua pintura: se antes ela exibia uma forte verticalidade simétrica e uma distinção clara entre figuras do plano de frente e o plano de fundo, essas características se atenuaram na pintura produzida a partir dos anos 1970 pelo recorte das formas e pelo emprego abundante da cor, sobretudo na série de emblemas: logotipos poéticos que produziu entre 1974 e 1975.