Sebastião Bernardes de Souza Prata - Grande Otelo (Uberlândia, MG, 1915 – Rio de Janeiro, RJ, 1993) Considerado um dos maiores atores do século XX, Grande Otelo foi um artista multimídia, tendo trabalhado no teatro, rádio, cinema e na televisão. Versátil e dono de uma consagrada expressão facial e corporal, destacou-se como ator, cantor, compositor, sambista e poeta. Seus personagens sempre tiveram um grande apelo popular, desde os tempos do Teatro de Revista, quando participou da Companhia Negra de Revistas, até quando interpretou Macunaína no cinema em 1969. Grande Otelo foi pioneiro e desbravador, primeiro artista negro a ocupar espaço de destaque no cinema e na televisão brasileira.
Desde a infância vivida em Uberlândia, sua cidade natal, Sebastião sempre fora atraído pela rua e pelas manifestações populares, como o carnaval e as congadas. Ainda pequeno foi considerado um menino prodígio, pois atingiu a maturidade artística muito cedo. O filme “O Garoto”, de Charles Chaplin, apareceu como uma influência decisiva no seu encantamento pela carreira de ator. Outra grande influência foi o ator mirim norte americano Allen Clayton Hoskins, que participava da série “Our Gang”. Otelo teve sua primeira experiência como ator aos sete anos, fazendo uma participação no circo que passava pela sua cidade natal.
Na ocasião, Bastiãozinho, como era conhecido, apareceu vestido de mulher interpretando a esposa do palhaço, o que causou enorme comicidade e sucesso.
Em São Paulo, aonde veio residir ao lado da família Gonçalves que o adotara, Bastiãozinho ganhou o nome artístico Otelo, que o acompanharia ao longo da carreira. O apelido surgiu na Companhia Lírica Nacional, onde o garoto tomava aulas de canto lírico. Devido à sua voz de tenorino, o maestro julgou que um dia o menino cresceria e cantaria a ópera Otelo, de Giuseppe Verdi. Pela estatura pequena, o apelido inicial foi Pequeno Otelo. Mais tarde, a crítica carioca, através de Jardel Jércolis, o denominou Grande Otelo.
Contrariando a previsão do maestro, o menino não só não cresceu, como resolveu cantar samba e ser ator. Foi então que em 1926, com apenas onze anos, tomou parte, com grande sucesso, numa importante companhia de teatro de revistas, a Companhia Negra de Revista, composta exclusivamente por artistas negros, como Pixinguinha, que atuava como maestro, Donga, músico, e Rosa Negra, atriz e cantora. Mais tarde, na década de 30, foi trabalhando na companhia de teatro de revista de Jardel Jércolis que Otelo chegou como artista ao Rio de Janeiro, realizando seu sonho de infância.
A cidade maravilhosa logo seria adotada como a cidade de Grande Otelo, espaço ideal para o menino de Uberlândia que sonhava em ser um grande artista. Apreciador da vida noturna da cidade, Otelo foi também um de seus atores, seja na famosa gafieira do Elite, no bar Vermelhinho ou nos bares da Lapa. Entre 1938 e 1946, paralelamente a trabalhos na Rádio Nacional, rádio Tupi e outras emissoras, o artista foi contratado do antigo Cassino da Urca, onde realizou diferentes espetáculos, sempre com destaque. Foi lá, em 1939, que Otelo contracenou com a famosa atriz e dançarina norte-americana Josephine Baker, momento citado por ele como um dos mais importantes de sua carreira. Ao longo desta mesma temporada no Cassino da Urca, Grande Otelo compôs, em parceria com seu grande amigo Herivelto Martins, o famoso samba Praça Onze que faria muito sucesso no carnaval de 1942. É importante registrar que na época negros não podiam entrar pela porta da frente do Cassino da Urca, fato que só passou a acontecer depois que Grande Otelo foi contratado para atuar no palco do Cassino.
No cinema, Grande Otelo foi uma das grandes estrelas da Atlântida cinematográfica, tendo protagonizado o primeiro grande sucesso da produtora, o filme Moleque Tião (1943), de José Carlos Burle. Também na Atlântida, Otelo formou, ao lado de Oscarito, a dupla mais famosa e bem sucedida do cinema brasileiro, que estrelou sucessos como Este mundo é um pandeiro (1946) de Watson Macedo, Três Vagabundos (1952) de José Carlos Burle, A Dupla do Barulho (1953) e Matar ou Correr (1954) de Carlos Manga. Em 1949 Otelo estrelou o filme Também somos irmãos ao lado de Ruth de Souza. O filme denunciou o racismo existente no Brasil e foi considerado o melhor filme brasileiro do ano pela crítica especializada, embora não tenha obtido sucesso de público.
Após deixar a Atlântida em 1955, Grande Otelo ainda participaria de inúmeros filmes, com destaque para o clássico Rio, Zona Norte (1957) do cineasta Nelson Pereira dos Santos, considerado o filme que inaugurou o Cinema Novo. Outros grandes sucessos foram Assalto ao trem pagador (1962) de Roberto Farias e Macunaíma (1969), adaptação da obra-prima de Mário de Andrade, dirigido por Joaquim de Andrade, e que lhe rendeu o prêmio de melhor ator do cinema brasileiro do ano. Curiosamente, Grande Otelo também participou do inacabado It´s all true (1942) filmado no Brasil pelo renomado diretor norte americano Orson Welles, que o classificou como um dos maiores atores do mundo.
O teatro, sua primeira paixão, não deixaria de contar com suas belas interpretações. Entre 1946 até o final de sua carreira o artista brilhou em inúmeras peças e trabalhou com os mais diferentes diretores, como Walter Pinto, Juan Daniel, Carlos Machado, Geisa Bôscoli e Chico Anísio. Algumas de suas peças de bastante sucesso foram, entre muitas outras: Um milhão de mulheres (1947), Muié Macho, Sim Sinhô (1950), Banzo aiê (1956) e O homem de La Mancha (1973). Na década de 50, Grande Otelo passou a atuar também na televisão em emissoras como a TV Tupi do Rio e Tv Rio. Em 1965 foi contratado pela rede globo, participando de inúmeras novelas e programas humorísticos. Em 1986 participou da novela Sinhá Moça, de enorme sucesso, onde contracenou mais uma vez com a atriz e amiga Ruth de Souza.
Apesar de inúmeros sucessos, a carreira de Grande Otelo foi marcada por altos e baixos. Sua indisciplina e seu gosto pela boemia e pela bebida fizeram com que faltasse muito a ensaios e apresentações, o que gerou a fama de irresponsável, injusta, em sua opinião. Umbandista, foi através da religião, na cabana de Pai Jatum, que diminuiu o consumo de bebida alcoólica, no final da carreira. Recebeu inúmeras homenagens e prêmios pelo conjunto de sua obra. Morreu em 1993, vitima de uma parada cardíaca.
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Fontes e Referências
Foto: Walter Firmo
Bibliografia:
BRITO, Deise Santos de. Um ator de fronteira: Uma análise da trajetória do ator Grande Otelo no teatro de revista brasileiro entre as décadas de 20 e 40. Escola de Comunicação e Artes/USP. São Paulo, 2011
CABRAL, Sérgio. Grande Otelo: Uma biografia. São Paulo: Editora 34, 2007.
HIRANO, Luis Felipe Kojima. Uma interpretação do cinema brasileiro através de Grande Otelo: raça, corpo e gênero em sua performance cinematográfica (1917 –1993). Tese de Doutorado. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas/USP. São Paulo, 2013.